Depois de 15 anos de insegurança jurídica nas pesquisas com material da biodiversidade brasileira, o Plenário da Câmara dos Deputados concluiu, em 10 de fevereiro, a votação do Projeto de Lei (PL) 7.735/2014. O PL, que agora tramita no Senado, simplifica as regras para pesquisa e exploração do patrimônio genético de espécies nativas do Brasil, além de estabelecer normas para uso dos conhecimentos indígenas e de outras comunidades tradicionais. A ABIFINA considera esta uma grande vitória, para qual a entidade trabalhou ativamente ao apontar os problemas da legislação vigente e ao propor bases para um novo marco legal. Foram oito anos de estudos, articulação com o setor produtivo e negociações com diferentes órgãos de governo.

Aprovado na forma de substitutivo do deputado federal e relator Alceu Moreira (PMDB-RS), o PL 7.735/2014 deve ocupar o lugar da Medida Provisória (MP) 2.186-16/2001. Esta vem sendo alvo de críticas da ABIFINA devido à falta de clareza nas normas estabelecidas e aos processos burocráticos que travam as atividades de pesquisa e desenvolvimento.

Em 2012, a entidade entregou ao governo seu posicionamento sobre o tema, indicando pontos críticos da legislação, entre eles os conflitos de conceitos, a forma da repartição de benefícios, a burocracia para aprovação dos projetos de pesquisa e desenvolvimento e as multas impostas de maneira arbitrária.

Autorização prévia

O único destaque aprovado pelo Plenário diz respeito às multas aplicadas às empresas ou pesquisadores que iniciaram pesquisas com material da biodiversidade antes da autorização prévia do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGen). Foi incluído novamente no texto um trecho do projeto original que vincula o perdão dessas dívidas ao cumprimento de um termo de compromisso de regularização das pesquisas.

Atualmente, a autorização prévia é um processo demorado e que exige grande documentação do pesquisador. Segundo o governo, a MP 2.186-16 dificulta a pesquisa e o aproveitamento do patrimônio genético, assim como a repartição dos benefícios de produtos originados da natureza, uma espécie de royalty pago à comunidade tradicional. Através do PL7735/2014, algumas atividades, como a pesquisa, serão objeto apenas de cadastro, e a repartição de benefícios será calculada apenas para o produto acabado ou material reprodutivo, no caso de agricultura e alimentos.

Repartição de benefícios

De acordo com o projeto de lei, o royalty será de 1% da receita líquida obtida com a exploração de produto acabado ou material reprodutivo (sementes ou sêmen, por exemplo) oriundos do acesso ao patrimônio genético. Entretanto, se houver dificuldades de comercialização, o governo poderá reduzir o percentual para até 0,1%, através de acordos setoriais.

A repartição poderá ser também não monetária, por meio de ações de transferência de tecnologia: participação na pesquisa e desenvolvimento tecnológico; intercâmbio de informações; intercâmbio de recursos humanos e materiais entre instituições nacionais e estrangeiras de pesquisa; consolidação de infraestrutura de pesquisa e de desenvolvimento tecnológico; e estabelecimento de empreendimento conjunto de base tecnológica. Quanto ao produto acabado originário do conhecimento tradicional associado cuja origem for considerada não identificável, o fabricante deverá, necessariamente, pagar o royalty na modalidade monetária por meio de depósito diretamente no Fundo (FNRB) sem acordo específico.

Produtos agropecuários

Outra novidade do PL é a inclusão dos produtos agrícolas e pecuários nas novas regras. O texto especifica que o royalty será devido sobre a comercialização do material reprodutivo (no caso de acesso a patrimônio genético) ou do conhecimento tradicional associado (para atividades agrícolas).

No entanto, será isenta do pagamento de royalty a exploração econômica de produto acabado ou material reprodutivo quando se tratar de espécies introduzidas no território nacional pela ação humana (soja, gado, cana-de-açúcar, por exemplo). A exceção é a variedade tradicional local ou crioula – aquela tipicamente cultivada pelas comunidades tradicionais e diferente dos cultivares comerciais.

Reformulação do CGen

Para tentar assegurar maior representatividade da sociedade civil, o relator Alceu Moreira propôs a reformulação do CGen, dividindo sua composição entre órgãos federais (com 60% dos membros), os setores empresarial e acadêmico, e populações indígenas, comunidades tradicionais e agricultores tradicionais (com 40% paritários entre empresas, academia e populações tradicionais). Moreira indicou ainda a criação, pelo Conselho, de câmaras temáticas e setoriais para subsidiar as decisões do Plenário.

Próximos passos

A ABIFINA continuará debatendo e atuando para a aprovação do PL 7.735/2014 no Senado, considerando a alta importância do novo marco legal para a indústria brasileira. O objetivo é solucionar a impossibilidade de as empresas cumprirem as regras atuais, o que as faz desistir de incorporar produtos da biodiversidade brasileira em suas linhas de pesquisa ou substituir extratos e substâncias nativas por similares sintéticos ou até plantas de outros países.

Fonte: Site ABIFINA